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7 de janeiro de 2005

Esperanças e 2005

Já tentou manter a esperança por muito tempo? Continuar confiante na vitória mesmo com a derrota a vista? Não seria muito mais fácil escolher um atalho, ou então fugir?

Às vezes penso nisso. Me cobro bastante nesse ponto. E quem não quer dar o melhor de si? Apesar de a resposta óbvia ser a de que todos nós tentamos dar o melhor de nos mesmos, na prática a verdade está longe disso.

Quando conheci o termo zona de conforto, fiquei perplexo como uma combinação de palavras explica a maior parte das ações humanas. Zona de conforto é um termo utilizado para designar o conjunto de circunstâncias às quais nos acostumamos a enfrentar. Nesse caso nem é enfrentar e sim viver, pois não há muitos perigos na nossa zona de conforto.

A zona de conforto é melhor delineada se colocarmos em seus limites os nossos medos. Por exemplo, se eu colocar o meu medo de rejeição em pauta, minha zona de conforto em se tratando de relacionamentos me impede de partir para novas conquistas.

No dia-a-dia a maioria de nós se encontra em situações onde se deixa levar pela rotina e não escapa da sua zona de conforto. Por exemplo, no trânsito: a maior parte das pessoas segue as mesmas rotas para chegar aos lugares conhecidos. Mesmo que o caminho escolhido implique em trânsito, esse é o caminho seguro uma vez que eu nunca conheci as outras alternativas. Portanto esse caminho está dentro da minha zona de conforto.

Acredito que quando somos crianças, nossa zona de conforto não está bem delineada. Ainda estamos descobrindo as suas fronteiras. Conforme vamos crescendo e nos acostumando com as regalias da zona de conforto, cada vez menos tentamos explorar além de suas fronteiras.

Aprendemos que se formos bons meninos, nossos pais não irão nos castigar. E aprendemos também que algumas traquinagens não irão afetar drasticamente essa relação. Portanto somos bons meninos, mas aprontamos um pouquinho. Na maioria das vezes sem ultrapassar os limites.

Mas e quando o medo fica maior? E se ao invés de bons meninos nós nos tornemos pessoas reprimidas? O coração muitas vezes não está ciente da zona de conforto e nos coloca em situações delicadas. Porém se calamos nossos corações por muito tempo, o que acontece com eles?

Alguns permanecem calados. Não se abrem mais para novas paixões. E podem nos levar a uma vida amarga. Outros continuam tentando bater em nossos peitos. E ainda assim nos causam sofrimento. Aquela euforia a ver a pessoa amada é reprimida (acho que isso deve causar câncer.. rs) e uma bela paixão que poderia florescer entre um casal, acaba se tornando apenas uma paixão platônica, em que depois de um tempo a fantasia e ilusão se tornam maiores que a própria chama original da paixão.

Nesse começo de ano todos nós colocamos na cabeça alguma resolução, algo que achamos que deveríamos fazer para melhor as nossas vidas, mas que normalmente não temos coragem de realizar pois esse objetivo está quase sempre distante da nossa zona de conforto (oras, se estivesse dentro da zona de conforto faríamos imediatamente). Eu resolvi que este ano eu tentaria expandir as fronteiras da minha zona de conforto. Resolvi encarar alguns dos meus medos. Mas percebi que fiz essa resolução, pois agora me encontro na fronteira da minha zona de conforto. Vivo o meu medo, o medo de ficar só. E acho que é isso que tem me dado força para enfrentar essa situação. Ao invés de fugir estou tentando lutar para vencer. Parar para pensar nas conseqüências é deixar com que o medo tente me dominar. E embora pareça precipitado, as vezes é bom agente se entregar às nossas paixões, aos nossos sentimentos.

Será que é realmente possível mudar? Acho que essa é a questão que me resta. O que vai acontecer quando eu me estabelecer novamente no centro da minha zona de conforto? Será que ainda assim vou insistir para romper as suas fronteiras?

Ou nos perderemos entre monstros da nossa própria criação. Será que vamos conseguir vencer?

Que as mudanças não nos levem ao desespero e que 2005 seja um ano onde mudanças e melhorias caminhem juntas.

O que será que será?

Aos pouco venho aprendendo a reconhecer a genialidade do Chico. Conheço apenas algumas músicas desse grande músico, dentre elas a que dá título a esse post. Porém nunca tinha reparado em um detalhe. Sempre que cantava essa música no karaokê sentia falta de algumas partes da letra que eu jurava existir em minha memória.

E só depois de muito tempo percebi que existem duas versões dessa música. Uma delas é a que transcrevo abaixo, com certeza a minha predileta: À flor da pele. E a outra tem o mesmo ritmo e a mesma estrutura, porém tem um sentido diferente. É mais sutil aos meus olhos. É “À flor da terra”. As duas são ótimas, porém enquanto "à flor da pele" me faz pensar em uma paixão, "à flor da terra" me leva a imaginar um pouco além. Tem um pouco de paixão no sentido de liberdade, de êxtase. Mas o que será que será?

O que será (À flor da pele)
Chico Buarque/1976

O que será que me dá
Que me bole por dentro, será que me dá
Que brota à flor da pele, será que me dá
E que me sobe às faces e me faz corar
E que me salta aos olhos a me atraiçoar
E que me aperta o peito e me faz confessar
O que não tem mais jeito de dissimular
E que nem é direito ninguém recusar
E que me faz mendigo, me faz suplicar
O que não tem medida, nem nunca terá
O que não tem remédio, nem nunca terá
O que não tem receita

O que será que será
Que dá dentro da gente e que não devia
Que desacata a gente, que é revelia
Que é feito uma aguardente que não sacia
Que é feito estar doente de uma folia
Que nem dez mandamentos vão conciliar
Nem todos os ungüentos vão aliviar
Nem todos os quebrantos, toda alquimia
Que nem todos os santos, será que será
O que não tem descanso, nem nunca terá
O que não tem cansaço, nem nunca terá
O que não tem limite

O que será que me dá
Que me queima por dentro, será que me dá
Que me perturba o sono, será que me dá
Que todos os tremores me vêm agitar
Que todos os ardores me vêm atiçar
Que todos os suores me vêm encharcar
Que todos os meus nervos estão a rogar
Que todos os meus órgãos estão a clamar
E uma aflição medonha me faz implorar
O que não tem vergonha, nem nunca terá
O que não tem governo, nem nunca terá
O que não tem juízo